Era o galã da noite. O terror do bailinho da maturidade.
Fazia as “cocotas” com mais de 50 e 60 corarem, aflitas de desejo por sua malemolência e remelexo.
Caprichava na apresentação: Durval Leôncio Pitombeira, desembargador pernambucano aposentado, viúvo, bem de vida e de bem com a vida. A fim de viver.
Quando se referia ao cargo de aposentadoria, enfatizava a pronúncia: “dizembarrrrrrrrrrrrrgcadôôôrrrrrrr”.
A boate parava para ver aquela versão caruaruense de Tony Manero, com bucho de Genival Lacerda e requebrado de Ricky Martin em sobrepeso.
Mas era na hora da gafieira que ele fazia “fazer fila”.
Uma a uma, as balzaquianas se derretiam. Tinham que passar pela mão do “Doutor Durval”. Ele, gozador, prometia “desempacotar todinhas”!
E, de quebra, dar um “amasso” na mesa do cantinho, ao som de clássicos de Noite Ilustrada, Nelson Gonçalves ou Altemar Dutra. Ainda se desse, garantia uma “armazenada” nas carentes, fazendo-as gemer sem sentir dor...
Sua chegada na “casa de espetáculo” era apoteótica.
Sempre de táxi, já que dispensava o motorista aos sábados, calça e sapatos brancos, camisa de gola “rolê” engomadíssima, paletó xadrez. Perfume exalando sensualidade, carga comprada segundo ele na França, na “Xanzelizê”, como ele gostava de ressaltar.
Naquela noite, não teria para ninguém.
Como de hábito, desembarcou do carro branco com número na porta, apertou a mão do motorista, colocou o Panamá na cabeça branca. Abriu a porta e foi para o ataque. Sua chegada era uma das mais esperadas...
O lenço pendurado no bolso era majestosamente empunhado para secar as gotículas de suor e o micro pente ajeitava os leitosos cabelos do grosso bigode. Tudo para a platéia notar que o dono da festa estava no pedaço.
Seria a “Noite do Caribe”. Na pista, só ritmo latino. Uma das especialidades do “magistrado”: cha cha cha, merengue, mambo, bolero e cumbia. Sem contar o gran finale, com um bom tango portenho que só o Doutor sabia dançar, versado em Buenos Aires que era.
Há tempo estava de olho na Berenice, chefe de departamento da inativa do INSS. Admirava demais aquela “loba galega” que, segundo ele em seus pensamentos mais pecaminosos, não tinha bunda. Tinha um contêiner inteiro.
Berenice olhava com olhos de safadeza, mas recuava das investidas do homem da Justiça.
Mas na noite caribenha, estava decidida a arrebentar.
Foi o som invadir a pista para o Doutor Durval começar a azaração. Seu suingue era a atração do espaço. Berenice olhava e, seduzida, tomava coragem.
Daqui a pouco, só davam os dois na pista! Foi de tudo um pouco. Em minutos, estavam agarradinhos. A cada verso e a cada ritmo era “chumbrego” em crescente. Doutor Durval suava e quase não acreditava. Iria “faturar” a “Berê”.
Na hora do cha cha cha, do bate traseiro, foi uma loucura total. Berenice, que não economizava em “derrière”, quase quebrou a clavícula do Doutor. Ele, quase cor de pimentão, era excitção pura. Iria pegar, em breve, naquela “carne”... Uiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiuiui!!!
Quando chegou o bolero, foi rosto no rosto e bafo no bafo. Berê, seduzida pelo “dizembarrrrrrrrrrrrrgcadôôôrrrrrrr”, chegou junto! Roçou no bigode e apertou o abdome avantajado do Doutor. Foi um frio na espinhela! Durval, suava, tonto, nocauteado. Só pensava no “contêiner”.
O final, tango de Gardel. E o Doutor era especialista! Foi tocar “La Cumparsita” para os dois colarem. Berenice e Durval davam show!
Era um entra e sai de perna e pé entre pé e perna que ninguém mais entendia. O público parou para ver! O salão ficou pequeno! O tango fervia e o Doutor também. O baile chegava ao fim e já já era a hora de “descarregar” aquela “mercadoria”.
Mas no momento do fim do tango, no beijo dos amantes, todo mundo viu. Berê se agarrou no bucho do magistrado esperando aquela “bitoca” de sucção. O Doutor alisou o bigode, fez bico de tucano e tascou-lhe beijo indescritível de língua... para depois desmaiar ao som da orquestra.
Foi um labafero!
Chama médico, SAMU, socorrista.
O Doutor tendo piripaque na boate, não podia!
Como comunicar à sociedade? E se o galã “bate as botas” no “dancing”? Manchete na certa!
Berenice era só apreensão. Perderia aquele “partidasso"? Pensão gorda, carinho e “fogo” para mais de hora?
A ambulância chegou, levaram Durval. Direto para o HGE.
No baile seguinte, ele faltou.
Souberam que não morreu!
Mas ele nunca mais voltou à boate!
Então, por que sumira?
Seu desaparecimento da noite jamais foi explicado!
Dizem que voltou à Recife, para tratamento na Caixa Beneficente do Sindicato dos Arrumadores.
O desmaio teria sido sinal de enfarte.
Resultado dos 35 anos em que Durval deu duro como desembarcador de navio, descarregando cargueiro de fertilizante, tomando cachaça, fumando que nem “caipora” e comendo pirão com buchada na zona portuária da capital de Pernambuco.
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