Qual o fundamento do exame?

O Exame de Ordem é uma forma de a categoria profissional controlar o ingresso de profissionais no mercado. Não deve ser um controle quantitativo, mas qualitativo. Em profissões técnicas, esse tipo de controle é necessário, pois protege o cidadão impedindo que pessoas sem o devido conhecimento técnico causem danos na prestação de serviço inadequada.

As demais profissões, no Brasil, controlam seus profissionais apenas com a exigência do diploma de uma faculdade. Em direito, a OAB cobra, além disso, a realização de um exame, tudo com base na lei, para que o bacharel em direito exerça a função de advogado. Sem a aprovação no exame, o bacharel pode exercer outros cargos também privativos para formados em direito, mas não pode ser advogado, pois não ingressa nos quadros da OAB.

Com o aumento expressivo das faculdades de direito no país, o Exame de Ordem tem chamado cada vez mais atenção pelo alto índice de reprovação.

Alguns números

Em primeiro lugar, é importante dizer que, mesmo as melhores faculdades, não foram tão bem assim. Veja que o índice da faculdade que mais aprovou em termos percentuais foi de apenas 67%. Apenas? Isso mesmo. Em tese, se a prova é um exame básico, a aprovação de faculdades consideradas de excelência deveria ter sido maior, não?

A UNB, que ficou em primeiro lugar em termos percentuais, teve 67%. Isso porque apenas 43 bacharéis fizeram as provas. Nesse ponto, quanto menos alunos fazem, maior o percentual, não é? No limite, se uma faculdade teve 1 inscrito e aprovado, aprovou 100%.

Em Alagoas, a FDA teve 111 egressos fazendo a prova e 50 foram aprovados. Ficou, assim, em primeiro lugar em AL e em 29º no Brasil com 45% de aprovação. Foi um bom índice? Diante dos demais, foi uma maravilha, mas, ainda assim, há muito o que rever.

Mas eu estou falando das melhores faculdades! Os números da FDA/UFAL estão longe da média nacional. Em Alagoas, houve faculdade com 3% de aprovação!

Esses números não se justificam. Algo está errado.

A massificação do ensino jurídico e o controle do MEC

Vamos deixar de ingenuidade. Há uma grande demanda pelo curso de direito. Há pessoas dispostas a pagar caro por um curso que, dentre os mais procurados, permite uma ampla gama de atuação profissional pública e privada.

Ilusão? Pode ser. Mas cada um responde por suas escolhas. Se há vagas em cursos com qualidade mínima, cabe ao mercado selecionar os melhores. O Estado não tem nada com isso.

Se há entes privados capazes de fornecer o serviço, não há nenhuma forma legal de impedir o surgimento de mais cursos de direito no país. Lembrem-se que o livre mercado é direito fundamental! Não demonizo o mercado. Ao contrário! Acho que se há uma demanda por cursos de direito e pessoas com dinheiro para pagar, não cabe ao Estado fazer controle de mercado e impedir o surgimento de novos cursos.

Porém, cabe ao Estado fiscalizar. É aqui que ele falha. O MEC ainda é muito tolerante com os novos cursos. Deveria exigir mais! Mais professores doutores, mais livros na biblioteca, mais exigência para os alunos, mais carga horária.

Além disso, algumas faculdades enganam o MEC. Alugam bibliotecas, contratam doutores só para dar palestras, inventam planos de cargos que só valem no papel. Quando o MEC marca uma visita, promovem todas as exigências de forma temporária, mudando tudo quando o curso é reconhecido e o MEC vai embora.

Some tudo isso à falta de qualidade do ensino médio. Alunos levam tais dificuldades para a graduação em direito. A faculdade de direito precisa ser muito boa para enfrentar esse desafio.

Lembro de um professor, amigo meu, que me disse uma vez algo que me deixou intrigado. O objetivo de uma faculdade (dessas privadas mais novas) seria transformar um aluno nível E (baixo), num bacharel nível C (médio). Enquanto isso, as federais já pegam o aluno A ou B e precisam apenas manter o nível. Nesse sentido, o papel das recentes faculdades privadas seria bem mais difícil.

É verdade. Por isso eu acho que se o MEC subisse o nível de exigência, não precisaríamos atacar o capitalismo para justificar a diminuição dos cursos de direito. Simplesmente porque não haveria como cumprir tantas exigências. Se o MEC exigisse, por exemplo, mais mestres e doutores, tenho certeza que não haveria profissionais suficientes. O papel das pós-graduações em direito é extremamente relevante nesse caso. Como formar mais mestres e doutores com qualidade? Deve-se tomar cuidado para que a massificação ocorrida na graduação não tome conta da pós-graduação.

A importância do exame

O problema, meus amigos, é que muitas pessoas não veem que o Exame de Ordem é um filtro importante da profissão. Estimula as faculdades a uma revisão de seus métodos e de seus currículos. Ademais, é realizado três vezes por ano. O bacharel, se fizer um bom curso e estudar direito, passa sem grandes problemas.

Não podemos, todavia, transformar o exame de ordem num critério único de medida da qualidade do ensino jurídico. A prova, na maioria das vezes, tem a estrutura de um concurso qualquer, exigindo do bacharel uma mera decoreba de leis, códigos e manifestações de tribunais. Direito é bem mais complexo do que isso. Mas para começar a encarar essa complexidade do ponto de vista da advocacia, algumas competências devem ser comprovadas. O Exame de Ordem é a forma mais republicana de fazê-lo.