O mal de grande parte dos esquerdistas dessa área de linguística é que eles gostam de nivelar por baixo. O que há nesse livro de tão absurdo? Ele ensina que a linguagem popular é tão correta quanto a linguagem culta, pois comunica do mesmo jeito. Então, falar “nós pega o peixe” seria o mesmo que falar “nós pegamos o peixe”.
Em primeiro lugar, podemos nem sequer entrar na celeuma acadêmica sobre isso. Existe mesmo um debate sobre o valor da linguagem popular ou da linguagem falada e um questionamento sobre a legitimidade dos cânones da língua culta. Isso ocorre também nas artes e na literatura em especial. É também um reflexo do atual debate multiculturalista.
Mas isso não tem nada a ver com o ensino da língua portuguesa. Esse debate é conversa para acadêmicos!
É como todo relativismo, quando ele se dá no âmbito epistemológico, é uma ótima forma de questionamento sobre as verdades ou postulados que em geral não discutimos. Mas quando é levado para os ambientes educacionais que exigem respostas, perdem todo seu sentido. Transformam-se em fábricas do erro.
Imagine que seu filho pergunta sobre se é certo roubar e você (bom esquerdista que é) responde: “depende, meu filho. Às vezes as condições sociais...” Pelo amor de Deus! O que esse livro idiota está fazendo é exatamente isso.
Em segundo lugar, estou levando em consideração a legitimidade do debate proposto sobre “preconceito linguístico” em ambientes acadêmicos, mas não concordo com essa conversa de jeito nenhum! É óbvio que a língua falada tem sua utilidade e consegue fazer a comunicação, mas há ambientes (Wittgenstein chamaria de “jogos de linguagem”) em que a língua culta é que é a norma!
Portanto, o que o livro diz é, em uma palavra, ERRADO! Não é a mesma coisa dizer “nós pega o peixe” e “nós pegamos o peixe”. Se o sujeito disser, numa entrevista de emprego “nós vai se esforçar muito” ele simplesmente não será contratado. Isso é preconceito linguístico, é? Como diz um amigo meu, é “conceito” linguístico mesmo. Se o sujeito não domina a norma culta, vai perder a vaga. Uma entrevista de emprego tem critérios de correção diferentes dos de uma roda de amigos.
A língua realmente não tem um padrão absoluto, pelo que a língua falada tem critérios muito mais abertos. Mas há ambientes linguísticos muito mais fechados e essa normatividade não tem nada a ver com preconceito. Não dá para mudar esses espaços pela vontade de alguns, ou pela vontade de muitos até. Essa normatividade é própria do ambiente.
É justamente na academia que se discute a legitimidade desses espaços. Conservadores de um lado e progressistas do outro vivem brigando sobre isso. Mas, definitivamente, nem um nem outro podem contestar a existência da norma culta e a sua importância no contexto de uma sociedade como a nossa.
Por isso eu explico sempre quando falo em Wittgenstein. Dizer que os critérios de um jogo de linguagem são abertos não significa dizer que não há critério nenhum. O sujeito que lê esse livro didático vai achar que os critérios são relativos e será levado a erro ao supor que falar em desacordo com a norma culta não vai lhe causar danos.
Algumas perguntas
Aí eu pergunto, amigos. Se a linguagem popular eu aprendo na rua, a escola não deveria justamente servir para me ensinar a linguagem culta? Afinal, para que serve a escola então? A educação é o mais importante instrumento de ascensão social. Como alguém vai subir na vida questionando a norma culta? Será que a autora do livro subiu na vida falando, na academia, a linguagem que ela fala na rua? Será mesmo que ela fala “nós pega o peixe”? Duvido.
Esse livro é, além de manifestação de ignorância, um crime contra a educação.