Era o maior pilantra da União. A cidade toda conhecia sua fama. Toinho Socó dava nó em pingo d´água, enganava vigário, tomava doce de criança...
Não queria e não fazia (muito) mal a ninguém, mas para tirar proveito, “biritar” de graça e passar a mão em mulher (inclusive alheia) não media esforços.
Tinha virado evangélico há uns dois anos e, a partir daí, sua vida mudara, para melhor. Arrumou emprego “fichado” na Usina, andava só de terno e “aprumado”, tinha a “escritura sagrada” sempre grudada debaixo do braço.
Um “homem de fé”, como passaram a classificá-lo, após a conversão.
Mas 24 meses de abstinência da vadiagem estavam dando vertigem. No culto, já não perdia um “lance” que escapava da “saieta” das irmãs.
Na Usina, escondidinho, dava uns ”tapas” na “caninha” e compartilhava com o Santo, mesmo não cultuando imagem.
De uns três meses para cá semanalmente “visitava” a Marilda, que “cobrava” baratinho e ainda topava beijo de língua.
Mas aquela notícia o transtornou. O presidente dos Estados Unidos em União dos Palmares. Era demais! Não poderia perder aquela chance!
Foi aí que o safado surtou. Ficou doido!
Montou plano para comer, beber e “amar” de graça. Daria tudo certo. Pediu “licença” ao Pai Celeste e avisou a si mesmo: daqui pra chegada do “negão” vou é me acabar.
Foi recaída da grande.
O plano contava com a cumplicidade inocente do tio Salu, morador lá do Muquém. Sessentão e jeitoso, Salu só andava na “beca” e nos “trinques”. Tinha sido segurança da Midô, nos anos 90.
Negro, cabelo e barba branca, era a cara do “preto véio”. Respeitador e devoto, homem de bem, tinha um defeito físico: um “derrame” o deixou com a fala toda “engrolada”, afetou sua língua.
E ao pronunciar, seus sons pareciam frases de outro idioma.
Pois bem, Toinho foi lá no Muquém, trouxe o tio para casa. Disse que queria matar a saudade do irmão da mainha...
Mas em toda a cidade a história que ele divulgou era bem outra: teria sido escolhido por um deputado estadual como membro efetivo do comitê de preparação da vinda do Obama.
E aquele senhor de “respeito” era embaixador norte-americano, chefão da CIA e do FBI, que veio inspecionar a cidade e garantir a segurança do presidente.
Outra coisa: o “ômi” era tio do “ômi” e estava na embaixada por força de “peixada” do “Baráqui”. Tudo “nesputismo dos estranjero” como dizia o Socó.
A fala de Salu, toda enrolada, era inglês do Texas. O Air Force One pousaria na BR 104 e seria abastecido na Laginha. Barack iria subir a Serra da Barriga e andar em toda a União. Os membros do comitê de preparação teriam que roteirizar o caminho prévia e diariamente.
Por isso iriam fazer paradas para provar, testar, comer, beber... tudo que os gringos iram consumir.
Umas “mulherzinha chêrosa” eram bem vindas, já que os americanos iriam dormir no mocambo e a “safadezazinha” e a “sem vergonhice” não tinham fronteiras, eram universais.
Toinho Socó passou uns 10 dias com tio Salu a tiracolo. Na buchada da Neide, fazia parada diária. A conta? “Iria direto para a ‘embaixada’” respondia à Neide.
E o embaixador não poderia ficar “de rango!”. Quando o irmão da mãe entrava no estabelecimento, a fala esquisita era “orientação do embaixador, que só entendido no ‘ingrêis’ sabia compreender”.
Salu, cara fechada, resmungava “echhshe mihnhinu eheh unh fhwilhlo dhah huutha”.
O sobrinho pintou miséria. A Neide foi só a primeira vítima. Toinho Socó “deu baixa” em boa parte do estoque de cerveja do depósito do Seu Silva, já que o “embaixador” era chegado a uma boa “bíer”.
Cachaça de retalho “akuardênti” no bar do Muringa foi “a rodo”. Esta, por se tratar de etanol e de matéria de defesa e segurança nacional, seria paga pelo próprio Pentágono.
No “tiosque” do Marinho a conta de passaporte se avolumou. “Mas o tio Barack iria propor montagem de McDonald’s com o Marinho”, na tradução do Salu feita pelo Socó.
Salu, só murmurava: “echhshe mihnhinu eheh unh fhwilhlo dhah huutha”.
A Marilda teve que fazer hora extra no recrutamento, já que as “meninas” que serviriam a comitiva passariam por “test drive” unicamente com o Toinho Socó. Ordem do “embaixador”, que por patriotra, só “copulava” com norte-americana. Daí ser tudo com o sobrinho. A turma do Obama tinha a missão de conhecer o mundo e o presidente ia precisar “dar um drible” na mulata Michele...
Para Marilda, Salu se esforçava em dizer: “ui ui ui echhshe mihnhinu eheh unh fhwilhlo dhah huutha”.
No sábado, todo o comércio da cidade estava esperando. A TV mostrou o avião pousando em Brasília, Obama abraçando Dilma, Dilma abraçando Obama.
Neide mandou comprar bucho de bode para 100. Silva e Muringa mandara ver no pedido de cerveja e de pinga.
Marinho encomendou 500 pães seda GG, porque os “sigurança do ômi era tudo dobrado”. Para agradar o presidente mandou até fazer roupa amarela de palhaço para a o Marinho Filho, que seria o Ronald McDonald de União durante a visita.
Marilda mandou nas “meninas”: banho de lavanda, vestido novo, tudo de Caruaru e Toritama. Iria ter dólar na cueca e na calcinha.
Mas veio domingo, Obama no Rio, Air Force One partindo... e nada de Alagoas.
Decepção geral e Socó no mundo.
O salafrário abandonou a congregação da Igreja e a cidade.
Dizem que veio ser assessor parlamentar de deputado novato na Assembléia Legislativa, em Maceió.
Neide, Marinho, Seu Silva, Marilda, Muringa, todos “fulos” da vida caíram em cima do pobre Salu.
Cadê o “embaixador”?
Encontraram o “preto veio” na rodoviária da cidade, já pegando o moto táxi para de volta para o Muquém.
O motoqueiro era seu vizinho.
Quando foi encontrado pelo grupo, com cara de sabedoria, falou de novo:
“Echhshe mihnhinu eheh unh fhwilhlo dhah huutha”.
Ninguém entendia o inglês.
- Embaixador, inglês? Perguntou o da moto.
- Que nada, Seu Salu é la do Muquém. Tem a língua “engrolada”, mas a gente entende.
- O que ele está dizendo é “esse menino é um filho da p....”.