A Usina Laginha foi a primeira usina que vi de perto; antes a idéia que tinha de uma usina se resumia às ilustrações de Percy Lau no livro “Vamos Estudar”, no antigo curso primário.

E esse primeiro contato é inesquecível porque se deu no rastro de uma travessura de criança, nos idos da década de 1960, quando passava as férias escolares na casa de minha tia Gilda, em União dos Palmares.

Minha tia Gilda era parteira e tinha muitos afilhados, alguns deles da minha idade, e eles me ajudaram como cúmplices nessas travessuras da Canabrava à Serra da Barriga, onde a família Paulo tem sitio.

Minha tia era casada com o João Paulo, irmão da Carmélia, da Zefinha, da Júlia. Pois bem; uma das nossas travessuras prediletas era ir à esplanada na estação ferroviária e pegar bigu nos trens que manobravam numa movimentação intensa na época.

Uma vez, pegamos bigu no trem errado – que não estava manobrando e passou direto pela estação. Era um comboio de carroças de cana, que seguia para a Usina Utinga Leão.

E agora, o que fazer? Pular do trem em movimento ou aguardar a próxima parada? E se fossemos bater em Utinga, como fazer para voltar a União?

O trem pegou embalo e o salto ficou cada vez mais arriscado; no mínimo iria quebrar a perna ou o braço – e isso se escapasse do salto.

Optei por ficar e aguardar. Para surpresa – grata surpresa – o trem reduziu a marcha e parou na Usina Laginha para deixar alguns vagões de cana. Saltei assustado, sem que ninguém me visse, e voltei a pé pelo trilho.

Voltei correndo, com medo. No Riacho Macaco, quase escurecendo, encontrei os parceiros de travessuras que não tinham me acompanhado na odisséia no trem de cana.

Relaxei reprisando na mente o filme da experiência de ter chegado tão perto de uma usina; de constatar a movimentação intensa em plena safra, num vaivém frenético de gente, de trens, de carro-de-boi e de muares que formavam a tropa dos cambiteiros.

Este ano, a Usina Laginha foi devastada pelo Rio Mundaú – que transbordou e arrastou o que estava pela frente, inclusive os pesados tanques para armazenagem do álcool e do melaço.

Muita gente pensava que a Laginha não iria sobreviver, até porque seu proprietário poderia muito bem transportar a cana para moer em outras unidades do grupo. Mas, é aí que o caráter de um homem se revela por inteiro no que de melhor o ser humano pode demonstrar – que é a gratidão.

O empresário João Lyra disse não àqueles que o aconselharam a não perder tempo com a Laginha e, sem demitir funcionário, em seis meses reergueu a usina tal qual a Fênix renasceu das cinzas.

A Usina Laginha renasceu dos escombros e volta a moer hoje garantindo emprego e renda, porque a perseverança, a competência e a dedicação de um homem juntaram-se como componentes de seu caráter.

Foi na Usina Laginha onde tudo começou e o empresário João Lyra não esqueceu isso. E quando a moenda for novamente acionada nesta sexta-feira, com certeza, naquele monstrengo de ferro o som que se ouvirá é de agradecimento de uma velha usina – que João Lyra não deixou o fogo apagar.

Sem dúvida, a ressurreição da Usina Laginha é um marco na história da industrialização de Alagoas, onde o empresário João Lyra tem páginas especiais pela sua competência, pela sua coragem e, especialmente, pela sua gratidão a quem nunca lhe faltou.