Um dos piores desmemoriados é o desmemoriado político. Ele se esquece, não se recorda, omite-se em lembranças de seus votos passados.

Não sabe em quem ele mesmo votou no último pleito e se nega a rememorar nomes e perfis dos candidatos, muitos deles eleitos neste vácuo de consciência cidadã, lamentavelmente comum no Brasil.

Ao esquivar-se destas reminiscências eleitorais, o desmemoriado político passa a não refletir criticamente sobre o custo de seu esquecimento convertido em tragédias espalhadas em nossas cidades, em nosso estado e em nosso país.

Tragédias de crimes, de fome, de miséria, de escolas precárias, de saúde aos frangalhos, de desemprego e desabrigo, de civilidade negada. Necessidades todas que para serem cobradas de nossos governantes dependem desta memória política, cívica e, por isso, grandiosa.

O desmemoriado político é tão burro que se orgulha de estufar o peito dizendo, muitas vezes entre gargalhadas cínicas e vergonhosas, que não faz questão de registrar na memória o voto confiado na última eleição.

Não sabe o imbecil que, de sua falta de memória e de seu voto esquecido, nascem a prostituta e o menor carente, ou mesmo o maior abandonado. Surgem os moradores de rua exterminados e as vidas jovens tomadas pelo crack. E ganha corpo e poder o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra e corrupto.

Ou até sabe o idiota que é este voto não rememorado, e por isso não acompanhado, não fiscalizado, não utilizado como instrumento de emancipação, um dos responsáveis por nossa paisagem de desolação social: Alagoas com sua mortalidade infantil humilhante, seus homicídios degradantes, sua infame falta de perspectiva em curto prazo.

Em tempo: este texto é fruto de uma inspiração indignada do célebre e original “O Analfabeto Político” do grande, do imensurável dramaturgo alemão Bertolt Brecht.

Apresento-o aqui somente para convidar o leitor a uma reflexão concreta, sobre um dado que me causou espanto: uma singela pergunta feita em recente pesquisa encomendada pelo TSE indicou que mais de 20% dos brasileiros que foram às urnas no dia 3 de outubro deste ano já não lembravam mais em quem haviam votado para deputado federal, estadual e senador.

Alarmante, não? Um quinto dos eleitores sem memória eleitoral, arcando com o custo e vivendo o castigo da alienação. 

Ainda mais quando sabemos que os nobres candidatos desperdiçaram uma cifra módica de 2,7 bilhões de reais com suas “educativas e elucidativas” campanhas eleitorais. Campanhas que tiveram, entre seus vitoriosos, figuras como o palhaço e hoje deputado federal Tiririca, ou Francisco Everardo Oliveira Silva, “parlamentar” mais votado do Brasil com um milhão e trezentos mil votos.

Mas "tiriricas" deixadas de lado, o dado do TSE nos revela o quão monstruoso e patético o cenário político vai se transformando. E o pior: em geral, não por culpa dos eleitos, mas dos próprios eleitores.

Cobrar de quem e o quê, se o eleitor sequer se lembra o nome daqueles que ganharam o seu voto e a sua esperança diante da urna eletrônica?

Reverter esta situação e aniquilar esta desmemória coletiva é missão urgente em nossa sociedade.

Caso contrário continuaremos a esquecer nomes de nossos dirigentes eleitos pelo voto.

Mas em nossas mentes continuará bem viva a recordação dos pesares que afligem nosso cotidiano de privações impostas pelas péssimas gestões públicas que nos governam.