Inteligente, bem empregada, nível superior, apartamento na Ponta Verde.

Bonita, muito bonita. E esnobe, bastante esnobe, preconceituosa, basbaque. Já trintona.

E solteira.

Dias e noites, madrugadas de solidão. Muito prazer: Laura.

Namoros, houve muitos. De “ficar” não era muito não, pois que seletiva, educada nos tempos áureos do São José, era rigorosa no padrão alto burguês. Mas a fila andava para a morena.

Já havia andado mais, e mais depressa no passado. Neste momento estava estacionada. Solitária, já se encaminhando para os quarenta, lamentava o caritó. Mas movida que era pela mola mestra da aparência e da riqueza, achava que beleza e dinheiro punham mesa.

Baseava sua busca na presunção da imagem e do status.

Para ela, homem só estudado, culto e bastante bem de bolso. Pobretão, ignorante e iletrado, nem pensar. E a caçada era incessante.

Na noitada, no trabalho, na repartição. Olhava, e não encontrava o príncipe, o prometido, seu Romeu, tal qual personagem de Shakespeare. Só que bem de vida e de fachada tinha que ser o seu Montecchio.

Que martírio, que sina de ficar para titia!

Os dias se passavam e o rosário de nomes também.

Artur, Rodrigo, Afrânio, Silas, Valentin, gringo italiano, Doutor Praxedes, o juiz, Ademar, Vitinho, o personal trainer, o Major, Mauricinho e Camilo, ou fazendeiro de Palmares ao agiota do Farol. Teve o dono do lava jato, que até tentou, e também o gerente do supermercado, que casado era, recursos tinha, porém Laura não queria divisão. Um ABC de candidatos, uns de contato mais estreito e longevo, outros de olhares e dissimulações apenas.

Nenhum de compromisso sério, fixo, duradouro. Nenhum de casamento.

Até que apareceu Messias. Terno escuro, carro novo, pele bronzeada, pasta de executivo. Moreno cafuzo, de uma rudeza sedutora, meio selvagem e bruta, rosto como que uma versão latina e renovada de Riccelli. Tatuagem no braço, peitoral avantajado. Falava um pouco arrastado e errado, mas exigir doutorado em lingüística já era demais.

Cruzaram-se na saída do restaurante grã-fino na Jatiúca. Laura olhou, ele piscou. Automóveis lado a lado, troca de telefones. Foi ela quem ligou. Ele alegou que livre só estava após as 22 horas e final de semana era no batente. Tinha dois empregos. Representante comercial do setor alimentício e diretor de logística e fluxo automotivo, na fala dele. Tinha também atuação no ramo dos negócios em turismo, com transporte marítimo e embarcações. E havia um outro promissor business à vista, ramo de congelados, alto gabarito, alto valor agregado. A elegância era exigência das funções e o apuro na beca questão de estilo, respeito e diferenciação.

Marcaram num barzinho no Stella Maris. Ele não bebeu, nada comeu. Chegou a pé, maleta 007 preta à tiracolo, terno escuro e camisa branca, gel no cabelo. Carro? Ficara no trabalho. Domingo e sábado seriam corridos, muitas atividades, reuniões, approachs. Ofereceu doce para ela, que recusou e achou a cantada diferente. Foi muita conversa, um papo que ela desconhecia, malandro, sedutor.

Laura enlouqueceu. Messias a segurava no braço com sua mão grossa, suada, calejada, nas pernas, dava cada apertão, usava gíria no pé do ouvido, sabia da maré e da ruas, conhecia os flanelinhas e ambulantes, em termos de profundidade e conhecimento discorria sobre o CSA e o CRB como quem debate filosofia do Direito.

Enfim, era de uma macheza que ela desconhecia. Falava grave e foi logo botando banca. “– Mulher minha anda ‘pianinho’!

Naquela mesma noite, ambos viveram esplêndida cena de amor, no apartamento de Laura, já que Messias morava longe, muito longe.

Manhã, sol nascente ao chão, Laura acordou, fez café para o recém amado. Aquele não iria escapar. Um homem incomum, exótico.

Um homem de verdade.

Messias acordou, alimentou-se bem, como um estivador, e amou de novo sua nova conquista.

Pediu para voltar a noite! Laura disse que sim.

A casa poderia ser dele, assim como ela, para sempre, se ele assim quisesse.

Messias saiu e foi ganhar seu pão...

Afinal, tinha que pagar o aluguel da casa de conjunto na Forene. As vendas de biscoito lanche e bananola estavam muito fracas e como manobrista a gorjeta estava cada vez mais difícil. E final de semana tinha que recrutar muito turista para o passeio de jangada na Pajuçara, porque temporada ainda não era.

Sem contar o bico que já estava articulado na fábrica de picolés, em alta após a campanha eleitoral... Olha o Caicóoo...!!!