Estamos vivendo um exemplo de como o relativismo pode ser nefasto. Pensar que a verdade é só uma versão que ganha aceitação é uma visão filosoficamente frágil e politicamente perigosa. É frágil porque confunde causa e efeito. A proposição verdadeira é aceita porque é verdadeira e não o inverso. A aceitação não é o critério de verdade.
Tampouco se pode dizer que a verdade depende da utilidade prática. É a utilidade prática quem depende da verdade. Assim, uma proposição falsa pode ser útil, mas isso não a torna verdadeira. A verdade, no entanto, normalmente serve para resolver problemas práticos e é por isso que nós recorremos à ciência e à lógica não somente numa busca contemplativa.
Na política, acreditar que não existem verdades a não ser aquelas criadas pelas comunidades linguísticas é algo extremamente perigoso porque abandona a ética. Sem o limite mínimo da correspondência com os fatos, pode-se tudo.
É isso que o PT tenta fazer com esse episódio da agressão a José Serra. Não querem reconhecer um fato, gravado por câmeras e confirmado por peritos. Serra foi agredido por outro objeto, que não uma bolinha de papel. Assim, ao contrário do que disse Lula, não houve farsa alguma.
Mesmo depois de desmascarado o erro do SBT, alguns petistas teimam em reconhecer a verdade e se voltam contra a Rede Globo. Falam como se pudessem, pela repetição, transformar uma mentira em verdade.
Em homenagem a essa turma, cito um trecho de 1984, de George Orwell:
– Lembras-te de escrever no teu diário: “Liberdade é a liberdade de escrever que dois e dois são quatro?”
– Lembro.
O’Brien mostrou a mão esquerda, de dorso para Winston, com o polegar oculto e mostrando quatro dedos.
– Quantos dedos tenho aqui, Winston?
– Quatro.
– E se o Partido disser que não são quatro, mas cinco... quantos?
– Quatro.
A palavra acabou numa exclamação de dor. O ponteiro do mostrador fora até cinqüenta e cinco. O suor brotara em todo o corpo de Winston. O ar rasgava-lhe os pulmões e saía de novo em profundos gemidos que nem mesmo trincando os dentes ele conseguia calar. O’Brien observava-o, com os quatro dedos ainda estendidos. Puxou a alavanca. Desta vez a dor apenas diminuiu um pouco.