Erros de arbitragem estão causando o maior rebuliço no futebol mundial. A FIFA e a IFAB relutam em usar tecnologia e imagens para solucionar dúvidas no decorrer do jogo. Os mais conservadores alegam que isso tornaria o futebol desigual, pois em campeonatos regionais, nem sempre haveria disponibilidade de dinheiro para manter a mesma tecnologia usada pelos grandes campeonatos. Isso levaria à afirmação de que o futebol teria regras diferentes a depender de onde seria jogado.

Essa bobagem ocorre porque estão confundindo as regras do jogo com os lances ocorridos nesse mesmo jogo. Wittgenstein, com sua pragmática da linguagem, tendia a defender a possibilidade de confusão entre fatos e normas. É que os jogos de linguagem variam no tempo e isso acontece justamente porque os conceitos mudam. Portanto, o que, hoje, é considerado um fato relevante para constituir critério para o uso de um conceito, amanhã pode deixar de ser relevante, o que significa que o conceito mudou e que, nesse sentido, a linguagem mudou.

Mesmo Wittgenstein destaca, todavia, que isso não significa a confusão absoluta entre o que é critério (regra gramatical) e o que é sintoma (evidência empírica), ou entre o que é regra do jogo e o que é o lance no jogo.
Fazendo um paralelo com o futebol, temos que as regras do jogo são aquelas 17 regras, enquanto os fatos a serem verificados são os aqueles ocorridos na partida. Sendo assim, não se podem confundir instrumentos de aferição de fatos com as próprias regras do futebol. Quando incrementamos as possibilidades de aferir se a bola entrou na meta ou se o atacante estava em posição de impedimento não estamos mexendo no conceito do futebol, mas sim nas possibilidades de aferir corretamente a existência dos fatos na partida.

Por isso, não faz o menor sentido proibir o uso de tecnologia argumentando que isso levaria à existência de dois jogos diferentes. O jogo é o mesmo porque as regras são as mesmas. O que muda são os instrumentos para aplicar as regras e verificar a existência dos fatos por elas previstos.

No direito e na vida em geral isso é bem mais complexo, obviamente. Essa complexidade é o que permite a mudança dos jogos de linguagem. Quando um cientista descobre que um determinado fenômeno que parecia acidental é, na verdade, essencial a um conceito, esse fato passa a ser visto como regra gramatical (num sentido semântico) e, portanto, deixa de ser só um sintoma e passa a ser critério. Isso não ocorre no futebol, pois se trata de um ambiente simples. Nesse tipo de jogo, a estabilidade das regras é essencial, por isso podemos identificar claramente a distinção entre fatos e normas.

Justifico, assim, ser plenamente compatível com as regras do futebol a existência de mecanismos tecnológicos e de imagem para aferir a ocorrência de faltas, impedimentos e do próprio gol. Isso evitaria muitas frustrações.
 

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