Além dos comentários no blogue, recebi várias mensagens de leitores sobre o texto publicado aqui em que tratei do movimento estudantil. A campanha na UFAL continua e alguns interpretaram meu texto como sendo “contrário aos estudantes”. Só se for contrário aos estudantes baderneiros.
Ano passado fui entrevistado pela acadêmica de Direito em Sergipe Mirella Scarlati sobre o assunto. Respondi o óbvio. Tudo em plena coerência com o texto atual no blogue. A entrevista tratava da ocupação da USP por alguns estudantes e o embate com a polícia.
1. Em sua opinião, a ocupação da USP pelos universitários é um exemplo de busca pela justiça ou um exemplo de “baderna”?
Respondo: Trata-se simplesmente de baderna. Seja lá qual for a pauta (e ela nem é das melhores), nada justifica, numa democracia, usar da força para intimidar quem quer trabalhar ou se locomover livremente. Os alunos que fizeram isso e ainda cercaram policiais militares que estavam na USP trabalhando, mereciam e merecem ser reprimidos pelo aparelho estatal. Quem não entende isso não entende o que é viver num Estado Democrático de Direito.
2. Para muitos o curso de direito é uma carreira que possibilitará viabilizar os direitos dos cidadãos. Um aluno de direito que não acredita na justiça estaria se tornando um facilitador para desvios de conduta?
Respondo: Não acho que seja necessário acreditar num conceito essencialista de Justiça. Acredito, inclusive, que seja possível questionar filosoficamente a noção de Justiça como um ideal.
Penso, todavia, que não só o aluno de Direito, como qualquer cidadão, deve orientar suas condutas de acordo com valores e princípios éticos, mesmo que tais princípios sejam considerados uma construção histórica e contextual. Não se pode abrir mão dos valores democráticos, por exemplo. Eles são, historicamente, aqueles que formaram as melhores formas de convivência social até hoje experimentadas pelo ser humano.
Penso desta forma, que o aluno de Direito pode não ter uma idéia forte de Justiça e, mesmo assim, agir de forma ética em suas condutas profissionais e lutar pela democracia. Pode-se ser crítico sem ser relativista.
3. Em sua opinião como os jovens acadêmicos deveriam expor suas opiniões dentro das universidades, em questões que muitas vezes só os atingem de forma indireta?
Respondo: Sou completamente a favor do movimento estudantil. É uma forma saudável e democrática de associação e pode servir como voz dos estudantes em questões políticas tanto mediatas quanto imediatas. A própria Universidade tem vários ambientes colegiados em que o estudante participa com representação e direito a voz e voto.
Com tantos instrumentos democráticos, por que razão alguns estudantes insistem em invadir prédio público ou impedir a passagem das pessoas? O movimento estudantil precisa deixar de ser instrumento de partidos políticos e passar a reivindicar as pautas comuns dos estudantes. Precisa lutar pela melhoria da educação brasileira.
4. Os estudantes agem muitas vezes de forma agressiva, demonstrando seu descontentamento com alguma questão. Essas ações surgem pelos estudantes ainda não possuírem uma visão do todo ou porque o ambiente universitário deflagra esta postura reacionária?
Respondo: Não sei exatamente qual a causa de ações violentas como essa. Em minha opinião, trata-se simplesmente de intolerância. Algumas lideranças realmente incitam a violência como forma de ação política. Isso ficou claro no recente episódio na USP.
No pensamento político, o marxismo ainda é a regra na nossa academia, e seus intérpretes mais ortodoxos tendem a enfatizar o aspecto violento e revolucionário da teoria. Talvez isso seja um dos fatores a se considerar. Mas, com certeza, não é o único. Ademais, o pensamento de esquerda não depende da violência. Trata-se de uma radicalização que não é a regra na academia, e, por isso mesmo, é ilegítima.
5. Qual é o papel do professor em situações onde a instituição e os alunos entram em conflito?
Respondo: Pensando como professor de Direito, acredito que a preocupação fundamental do professor deve ser sempre com a formação do aluno da maneira mais ampla possível. A tarefa do professor no curso de Direito é preparar o aluno para a vida profissional ou acadêmica e para o exercício competente e eficiente do conhecimento obtido, levando em conta sempre o respeito pela democracia e pelos direitos humanos.
Em caso de conflito de interesses, o papel do professor deve ser o de ponderar ambos os lados e tentar encontrar um caminho que sirva ao interesse maior que é a melhoria da educação e a formação do aluno.
Quando, todavia, o conflito se dá entre quem respeita os direitos fundamentais e quem não respeita, perece-me que a resposta óbvia é ficar com o primeiro grupo. Se a instituição viola direitos de representação, por exemplo, a pauta dos estudantes é justa. Em caso de conflito, ficarei sempre do lado dos direitos fundamentais, notadamente o direito à educação.
Veja mais no arquivo do blogue: www.blogdoadrualdo.blogspot.com