Brasília é uma cidade feia e obscena. Antes que caiam de pau em cima de mim, eu vou justificar minha conclusão:

1) É feia porque foi projetada para valorizar o concreto e o carro, relegando gente, quando deve ser o contrário, porquanto não há cidade sem gente.

2) É obscena porque o Congresso Nacional se assemelha a um pênis ereto, com as conchas da Câmara e do Senado representando os testículos.

Mas, a sabedoria popular se encarregou de arrumar as coisas, de modo que já existem esquinas - que alteram a idéia inicial; e churrasquinhos nas paradas de ônibus – o que dá o gosto de cidade para humanos.

Isto, entre outras providenciais alterações que a raça humana é capaz de produzir a fim de se moldar ao habitat. E, sendo assim, apesar de tudo aprendi a gostar de Brasília.

Quem me ensinou a gostar de Brasília foi a Neide, uma funcionária da Câmara Federal que trabalhou com o deputado José Thomaz Nonô. Carioca, é bem mais nova que a Capital Federal e, quem sabe por isso, pode descobrir seus encantos.

Para a Neide, o gostoso de Brasília é dirigir de madrugada pelo Eixão ouvindo Bob Dylan.

Cada um, como se pode deduzir, procura encontrar o jeito de suportar Brasília e todos parecem conformados e felizes. Acharam os seus espaços que não constam no projeto calcado em concreto e carros.

E, como todos procuram os seus espaços, a classe política vai à luta com todas as armas que dispõe – e a que não dispõe também, mas a criatividade humana permite. Afinal, político também é gente.

Por exemplo: depois do deputado que acertou mais de cem vezes na loteria, depois do pagamento de propinas e do mensalão, depois das comissões pagas por fora pelas empreiteiras, enfim, depois de tudo de contravenção que se fez, ainda tem outras tramas para subtrair dinheiro público.

Conforme denunciou o Congressoemfoco, jornal eletrônico que está pautando o restante da mídia nacional, o golpe mais recente é do vale-transporte e auxílio-creche.

O esquema funciona com funcionários fantasmas, que emprestam o nome, documentos e cumprem com toda a burocracia, e no final do mês deixa os salários – eles recebem apenas o vale-transporte e o auxílio-creche.

É assim com um vendedor de pastel no Gama, que sobrevive com o salário de 650 reais mensais, mais 250 reais de auxílio-creche da Câmara para os quatro filhos, quando legalmente é um servidor da Camara com vencimento de 7 mil reais mensais!

Humilde, ele não sabia que os papéis que mandaram assinar eram os formulários para contratação como secretário Parlamentar; ele pensava que era apenas para receber o auxílio-creche.
Pergunta-se: como contratar um funcionário-fantasma sem o conhecimento do deputado – no caso de o contrato se referir ao gabinete – ou do diretor da Casa?

Não é à toa, caros internautas, que às vésperas de completar 50 anos de fundação, o governador de Brasília está preso e o vice-governador pediu para sair antes que o colocassem para correr.

Acho que tudo isso acontece porque Brasília não foi feita para gente morar.