Jeito tímido e poucas palavras. Aos 22 anos, Maria Gadú, uma das novas queridinhas da MPB, ainda se assusta com a ideia de ter um disco com oito composições suas. “É muito íntimo. O meu lado mais sensível está nas letras”, diz.

Seu disco de estreia, recém-lançado pela gravadora Som Livre, leva seu nome como assinatura. Aliás, Maria na verdade é Mayra. “Resolvi trocar. O original não fui eu quem escolheu, né?, diz, com jeito de quem realmente não gosta muito de falar de sua vida íntima.

Maria começou muito cedo. A primeira composição, Shimbalaiê - que está no CD - foi feita quando ela tinha apenas 10 anos de idade. “Foi um susto. Veio de uma só vez”, diz. Aos 14 anos, ela já se apresentava em alguns bares da Vila Madalena, reduto boêmio de São Paulo, onde cantava músicas de medalhões da MPB, como Gilberto Gil, Lenine, Rita Lee. Há dois anos, foi passar férias no Rio de Janeiro. Decidiu ficar e, por lá, ganhou a chance que todo artista da noite sonha: gravar seu primeiro CD.

O caminho foi encurtado pelas mãos de Jayme Monjardim. Amiga da mulher do diretor, a também cantora Tânia Mara, Maria acabou se apresentando no workshop que Monjardim estava fazendo sobre a minissérie Maysa, exibida pela TV Globo no início deste ano.

A novata acabou caindo nas graças dos executivos da Som Livre, que a convidaram para gravar. O álbum de estreia traz, além das oito composições próprias, as regravações de A História de Lily Braun (Chico Buarque), Ne me quitte pas (Jacques Brel) e Baba, um dos sucessos de Kelly Key.

Em bate-papo com ÉPOCA, Maria falou da sensação de ser elogiada em seu primeiro trabalho e diz não entender o estranhamento das pessoas ao ouvirem a sua versão para a música Baba. “Música é música. Eu ouço de tudo. Não tenho preconceito”.

ÉPOCA - Você começou cantando em barzinhos muito nova? Era permitido você trabalhar aos 14 anos?
Maria Gadú - Ah, boteco não tem muito disso. Eram lugares menores. Nunca tive problema. Tenho 1,70 m de altura. E, aos 14 anos, já tinha essa altura, que, para uma mulher, até que não é tão baixinha.

ÉPOCA - O que você cantava nessa época? Recebia muitos pedidos de músicas?
Maria - Eu cantava Chico, Caetano, Milton Nascimento, Marisa Monte, Rita Lee, Lenine. Rolavam muitos bilhetinhos no guardanapo, sim. Mas era gostoso. Apesar de passar anos e anos cantando as mesmas músicas, não tenho nenhum trauma dessa época. Era muito bom.

ÉPOCA -Como você chegou a Som Livre?
Maria - Eu conhecia a Tânia Mara e o Rafael Almeida (ator e cantor, irmão de Tânia) de São Paulo. A gente tocou várias vezes juntos. Quando me mudei para o Rio, acabei entrando em contato com a Tânia, que havia se casado com o Jayme Monjardim e estava morando no Rio também. Fui um dia tocar na casa deles. O Jayme estava fazendo a pré-produção da minissérie Maysa e me convidou para fazer uma participação na minissérie como uma cantora de boate. Acabei cantando em um workshop que ele fez para apresentar o trabalho à imprensa. Nesse dia, estavam lá alguns executivos da Som Livre, que gostaram e me chamaram para gravar.

ÉPOCA - E você gostou da experiência de participar da minissérie Maysa? Tem vontade de ser atriz também?
Maria- Foi muito divertido. A Maysa é fantástica. A minissérie tinha aquele cheiro de outra época que me encanta. Mas foi só isso. Para ser ator, é preciso nascer com o dom. E eu não tenho isso. E, outra: minha timidez nunca me permitiria ser atriz.

ÉPOCA - O disco traz oito canções suas, nenhuma delas você compôs em parceria. Você prefere criar suas músicas sozinha?
Maria - Não é que eu prefira. Geralmente, quando as ideias surgem, estou sozinha. E vem tudo junto: letra, música, melodia. Detesto ter que ficar “ralando” em cima de uma canção. Tenho algumas composições com outros compositores. Estou conhecendo uma galera que escreve e estou achando divertido. Devem aparecer outras composições em parceria por aí.

ÉPOCA - A primeira música de trabalho do CD é Shimbalaiê, que você fez aos 10 anos de idade. Ela estava guardada esperando uma oportunidade?
Maria - É. Foi minha primeira composição. Meu primeiro susto. Mas eu não gostava dela, achava horrorosa. Quando fui gravar o CD, o Rodrigo Vidal, que é o produtor, pediu que eu mostrasse todas as minhas composições. Ele queira saber qual era a primeira. Relutei em mostrar. Aí ele decidiu que íamos gravar. Hoje em dia até gosto dela...(risos)

ÉPOCA - No seu disco, você mistura vários ritmos, como maracatu, samba, reggae, pop. Quais são as suas influências? O que você gosta de ouvir?
Maria - Ouço de tudo. Sem preconceito algum. Sou uma nerd. Gosto de pesquisar, fuçar aquilo que não está ao alcance de todos. Agora, conheci o Lokua Kanza, um cantor e compositor do Congo. Ele é absurdamente fantástico. Estamos trocando figurinhas, ele está me mostrando músicas da África. Estou adorando.

ÉPOCA - A música Dona Cila é uma canção de despedida para sua avó. Como é essa história? Maria - Na vida, sempre fui eu, minha mãe e minha avó. Fui criada com ela, que me ensinou tudo, desde música até como me relacionar com as pessoas. Ela morreu há três anos e fiz essa canção um mês antes de ela partir. Ela nem chegou a ouvir. Na juventude, ela foi cantora lírica, acabou perdendo a voz mas foi quem me ensinou a cantar.

ÉPOCA - Você está sendo apontada como uma das grandes revelações da MPB neste ano. Nomes como Milton Nascimento e Ana Carolina já a elogiaram. Como encara isso logo no seu disco de estreia? Sente uma responsabilidade a mais?
Maria - Responsabilidade sempre tem. É muito íntimo me expor no disco. É meu lado mais sensível. Mas é do c.... uma galera dessa me elogiar, ir aos meus shows. Fico lisonjeada. Se a opinião fosse negativa, também iria respeitar muito.

ÉPOCA - O Brasil é conhecido como a país das cantoras e, nos últimos anos, vários nomes surgiram no mercado. O que uma cantora precisa ter para ganhar destaque?
Maria - Não encaro dessa forma. Gravar disco para as pessoas gostarem ou ficar famoso é uma besteira muito grande. Se você fizer algo que não o agrada, vai carregar esse erro pelo resto da vida. Acho que o artista deve pensar por si. Fazer aquilo que é verdadeiro e não criar expectativas.

ÉPOCA - Por que resolveu regravar Baba, da Kelly Key?
Maria - Eu gosto dessa música. Fiz uma versão minha. Nada de mais. As pessoas têm essa mania de separar os estilos, separar os gostos. Música é música.

ÉPOCA - No encarte do CD, você agradece carinhosamente a Marisa Monte. Ela tem ajudado nesse começo de carreira?
Maria - Ela é minha diva-mor. Mesmo à distância, ele ajudou muito na minha formação. A Marisa é uma pessoa que sempre teve bom senso para cantar, para escolher repertório. Não a conheci pessoalmente. Temos um amigo em comum. Ela disse que gostou do disco.

ÉPOCA - Você vai participar do DVD da Ana Carolina?
Maria - A Ana me chamou para participar de um DVD que comemora os seus 10 anos de carreira. Vou cantar uma música dela que chama Mais que isso.