Suruagy, o político das grandes realizações e dos erros fatais

23/03/2015 10:05 - Geral
Por Davi Soares
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Quando tive a ideia de entrevistar o ex-governador Divaldo Suruagy, em julho de 2014, não fui incentivado apenas pela curiosidade sobre sua candidatura a deputado estadual. Queria produzir um registro histórico sobre a sua visão da política atual, comparada às turbulências e realizações que marcaram sua própria experiência na vida pública. Encontrei, na casa 580 da esquina das ruas Santa Fernanda com Eliseu Teixeira, na Jatiúca, um político saudosista, que mantinha funcionários e espaço dedicado a receber os cada vez menos presentes eleitores e aliados.

Era 16 de julho de 2014, exatamente um dia antes de serem completados dezessete anos da tumultuada votação de seu impeachment, no histórico 17 de julho de 1997, quando o ex-governador pediu licença, para evitar uma tragédia maior do que a que feriu três no tiroteio diante da Assembleia Legislativa do Estado. E enquanto eu esperava na antessala daquela casa onde nunca deixou de funcionar uma espécie de comitê político de Suruagy, lembrava-me que o acaso me levou a presenciar um de seus episódios mais infelizes.

Ao lado de meu pai, Antonio Soares, havia chegado de União dos Palmares para acompanhá-lo em consulta médica, no Centro de Maceió, no 17 de julho histórico. O médico havia cancelado as consultas por conta dos protestos de servidores com dez meses de salários atrasados. Tivemos que nos abrigar em um prédio da Ladeira da Catedral, no momento dos tiros e do conflito entre servidores e militares do Exército. Da janela de um prédio de 1º andar, vi quando as grades que cercavam a sede do Legislativo foram derrubadas. Preferi não me arriscar a olhar quando ocorreu as bombas e os tiros.

A lembrança daquele 17 de julho reforçou a minha necessidade de perguntar o motivo pelo qual um ex-governador desejava voltar ao Legislativo, em vez de seguir o rumo de Brasília-DF, como costumam fazer ex-chefes do Executivo. A resposta me surpreendeu pela emoção e as lágrimas que não se seguraram nos olhos do já frágil ex-governador de voz cansada, mas disposição física aparentemente boa:

“Eu não queria mais sair de Alagoas. Quero morrer em Alagoas”, disse-me o alagoano com mais realizações na política deste Estado, um homem que preferia apagar da história seu terceiro mandato, em que foi acusado da polêmica operação das “Letras Podres” do Tesouro Estadual, que resultou em prejuízo de R$ 537,3 milhões para Alagoas.

Na sequência, uma resposta positiva e as lágrimas interromperam a entrevista, quando perguntei se aquela decisão pela candidatura a deputado estadual seria uma prova de amor para Alagoas. Um repórter desconcertado surgiu diante de um vulto histórico que demorou cerca de um minuto para se recompor e retomar a entrevista. Me preocupei com sua saúde, fiz somente mais duas perguntas e não voltei a buscar detalhes de seu posicionamento sobre temas polêmicos como as tais “Letras Podres”.

Em uma resposta anterior, Suruagy já havia considerado “uma piada, uma brincadeira” o processo de impeachment pelo qual foi condenado em setembro de 1997. Sobre as dificuldades do último governo, que atingiu em cheio milhares de servidores públicos, falou do contexto difícil para Alagoas, a partir da estabilização da moeda.  E ainda desafiou: “Ninguém conseguiu encontrar nada que diminuísse a minha pessoa”

Apesar de o registro de sua candidatura a deputado estadual ter sido cassado pela Justiça Eleitoral, em agosto de 2014, por conta de sua condenação no caso das “Letras Podres”, ninguém conseguirá diminuir Divaldo Suruagy, um homem de grandes realizações e erros fatais que não conseguirão apagar sua passagem pela vida pública.

Ele mesmo tinha consciência plena disso: “Ninguém fez mais em Alagoas do que eu. Mas ninguém mesmo. Mande juntar todo mundo e ver meus governos. Eu dou um banho”.

Depois da entrevista, o simpático ex-governador me presenteou com um exemplar autografado do livro Poeiras da Vida. Pedi para fazer novas fotos e registrei um olhar sereno, após aquela que pode ter sido a última entrevista para a imprensa alagoana. Um convite para que retornasse sempre que quisesse foi retribuído com um “boa sorte”. Mas o agravamento de seu quadro de saúde resultou em seu falecimento neste sábado (21).

Aos familiares, amigos e assessores, os sentimentos deste repórter que relata aqui a experiência de ter conhecido o político e o ser humano Divaldo Suruagy.

Releia a entrevista de 2014 e a notícia sobre o falecimento do ex-governador.

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