Josué Silvestre da Silva, cinco anos. Sibele Ferreira dos Santos, oito anos. José Alfredo Vasco, 67 anos. O que essas pessoas têm em comum? Elas fazem parte das estatísticas da violência em Alagoas, assassinadas de maneira brutal ou por motivo fútil. E o que mais chama atenção é que nestes casos, que ganharam grande repercussão na mídia, a presença de menores – seja como vítimas ou acusados crimes – apontam uma triste realidade do país, com a maior participação deles no mundo do crime.
Eles foram – e continuarão sendo – manchetes de jornais, protagonistas das cenas mais chocantes já vistas por um povo. Sejam mortos a tiros, pedradas, facadas, as vítimas deixam na história da humanidade uma marca registrada após serem alvos de ações praticadas por aqueles que antes eram apreendidos apenas por consumo ilegal de álcool, furtos pequenos, ou até perturbação da vida alheia, crimes simples que normalmente passavam despercebidos.
Agora a história mudou de figura. Os inocentes se transformaram e buscaram novos caminhos no mundo do crime, ou mesmo foram aliciados para ingressar na vida fácil do mundo ilegal. Atraídos pelas facilidades desta rotina, foram ‘nomeados’ como Office boys do crime, levam recados, entregam drogas, cometem no lugar dos verdadeiros articuladores as mais variadas atrocidades inimagináveis para tais idades.
Em meio a tanta violência, uma pergunta que permanece sem resposta: qual o motivo para levar tantas crianças e adolescentes saírem da linha e optarem pelo risco de viver na criminalidade? Falta de políticas públicas eficazes? Leis punitivas que são frágeis demais para os menores?
Os pequenos Josué e Sibele deixaram as famílias com essas questões ainda sem respostas. Ambos integram a lista de assassinados e provavelmente devido ao tráfico de drogas. Dois casos ainda sem solução e que continuam sendo cobrados pela população.
Ainda não se sabe quem são os autores materiais dos homicídios. No caso de Josué, uma das linhas de investigação é de que o pequeno trabalhava como ‘aviãozinho’ (fazendo entrega de drogas para traficantes) e por isso, pode ter sido assassinado. Já no caso de Sibele, uma das possíveis causas de morte seria a denúncia feita pela mãe da presença de traficantes nas imediações de sua residência. Temerosa, ela foi à TV e denunciou o caso; coincidência ou não, duas semanas após, a pequena Sibele desapareceu e sua ossada só foi encontrada dezenove dias depois, num canavial perto da casa de uma tia.
O sonho de ser professora foi arrancado de Sibele. Definida como uma garota feliz, a pequena criança que emocionou Alagoas já não respira, não brinca na rua, deixou de lado as bonecas e esperança de mudar o mundo. O sonho dela era lecionar e já o fazia nas brincadeiras, em casa, com os irmãos. A criança era o orgulho da família. “Ela comentava que daria aula e já treinava com os irmãos menores. Era o meu orgulho”, lamentou Sueli Pereira Gomes mãe de quatro filhos que não se conforma que seus parentes tenham denunciado a violência e o tráfico na região.
Com lágrimas nos olhos, a dona de casa contou os dias de angústia que viveu com o desaparecimento da filha. “Minha filha estava brincando e de repente sumiu. Procuramos em todos os lugares e não encontramos nada. Foram 19 dias de muito sofrimento por não saber se ela ainda estava viva”, disse, lembrando os últimos momentos até encontrar a ossada da filha.
Após 19 dias de angústia, no dia 02 de outubro o desfecho do caso Sibele não teve um final feliz. Após uma denúncia anônima, policiais militares conseguiram encontrar uma ossada que poderia ser da pequena e, mesmo em avanço de putrefação, a mãe Sueli não se enganou: “É a minha filha, a minha Sibele”.
“Comeram minha filha viva. Lutei tanto para criar ela e os irmãos para acabar assim. É uma tristeza que não tem fim. Não aguento olhar para frente e ver o canavial que minha filha foi deixada. Preciso me mudar com minha família para outro lugar, tenho medo que o assassino volte e faça o mesmo com outro filho meu. Ele já me matou ao matar minha pequena”, desabafou.
“Lembro-me como hoje quando os vizinhos vieram me chamar e disseram que tinham matado o meu filho. Quando cheguei e vi a cena, fiquei em estado de choque. Meu filho estava morto dentro de uma valeta. Daria minha vida por ele. Não queria deixar enterrar meu filho porque eu acreditava que ele iria voltar para os meus braços”, disse Maria de Jesus dos Santos que perdeu o filho de apenas 15 anos de idade em maio de 2008.
Quatro anos após a morte do filho, a dona de casa disse que poderia ter feito tudo diferente. “Errei, confesso. Assim que soube que meu filho estava envolvido com drogas eu deveria ter dado um basta, mas não fiz isso. Acreditei quando ele disse que iria parar e pouco tempo depois ele já andava com um dos maiores traficantes da região”, disse emocionada a mãe que hoje é avó.
O jovem, que teve a identidade preservada, teria cometido pelo menos três assassinatos e estava no “Oiteiro”, um lugar bastante conhecido no bairro do Trapiche da Barra pela violência, quando encontrou um desafeto. Após uma breve conversa, o adolescente foi assassinado com um tiro no peito a queima roupa, sem qualquer chance de defesa. O adolescente deixou esposa e um filho de apenas cinco meses.
Agora, Maria que tem Jesus no nome, se apega na fé para conseguir viver com a ausência do filho e para criar o neto. “Queria morrer. É uma dor muito grande para uma mãe perder um filho, meu menino. Comecei a me apegar com Deus para ter forças e foi graças a ele e pelo amor que sinto meu filho que consegui criar meu neto, porque após a morte do meu filho, a mãe dele fugiu e deixo a criança comigo. Hoje ele me chama de mãe, é como se visse todos os dias meu filho nele”, disse bastante emocionada.
“Passar pelo local onde ele foi assassinado ainda mexe comigo. Minha mãe não quer nem continuar na casa onde morava com ele, chora todos os dias. Cada lugar, coisas simples do cotidiano ainda marcam nossas vidas. Tudo lembra meu velho pai. As pessoas costumam dizer que o tempo é o melhor remédio, mas eu não acredito nisso. A saudade é constante na vida de todos nós”.
O desabafo emocionado é de André Palmeira, filho do médio José Alfredo Vasco, assassinado no dia 26 de maio deste ano, durante um assalto na Praça Vera Arruda, no bairro da Jatiúca, em Maceió. Após quase cinco meses do crime, a família ainda tenta suportar a dor da perda e busca forças para conseguir seguir em frente sem a presença insubstituível do ente querido.
Pai de uma menina de apenas um ano de idade, Palmeira relembrou os últimos instantes que teve com José Alfredo, na tarde daquele fatídico sábado. “Era por volta das 16h. Tínhamos almoçado juntos na casa dele, dormimos e quando acordei saí com minha esposa e filha ao shopping. Ainda o convidei, mas como ele não gostava desse tipo de programa e preferiu seguir de bicicleta para fazer a caminhada rotineira. Foi a última vez que estive ao lado dele”, relembrou o filho.
Foi uma caminhada diferente das demais e, desta vez, sem volta. A demora de seu retorno para casa preocupou a esposa. Já passava das 18h30 e nenhuma notícia dele. Angustiada, a família iniciou uma busca pela cidade e chegou a fazer telefonemas para outros parentes, sem conseguir localizá-lo.
“Pressentia que algo de ruim tinha acontecido. As caminhadas eram sagradas, duravam 40 minutos e como ele não retornou, bateu aquela sensação de que o pior teria acontecido. Não sei explicar, mas foi um pressentimento, até o momento em que soube de um crime na praça, busquei informações pela internet e me deparei com a morte dele. Cheguei ao local e foi difícil acreditar no que estava vendo”, colocou emocionado.
Além de precisar lidar com a intensa dor, a família de Alfredo Vasco precisava arrumar forças e continuar cobrando a identificação e prisão dos acusados pelo brutal assassinato, que aconteceu quase dois meses após o crime. A autoria do crime, para surpresa da família, era de dois menores de idade, que atiraram no médico sem que ele tivesse chance de defesa, com o único propósito de roubar a bicicleta da vítima.
José Alfredo Vasco já retornava para sua residência quando foi abordado pelos dois menores armados no momento em que passeava pelo Corredor Vera Arruda. Os adolescentes tomaram a bicicleta da vítima que, mesmo sem reagir ao assalto, foi atingida por disparos de arma de fogo. A dupla fugiu em seguida. O médico morreu antes mesmo de receber atendimento.
No dia 13 de junho, a Polícia Civil confirmou que conseguiu esclarecer o crime e identificar os dois autores, graças a ajuda de testemunhas e as câmeras de segurança instaladas em prédios localizados nas imediações onde aconteceu o crime.
O menor W.G.F., 16 anos, já tem passagem pela polícia por envolvimento numa tentativa de resgate a detentos que participaram de queima de ônibus em Maceió, crimes ocorridos em dezembro do ano passado. Ele foi localizado no Vale do Reginaldo, no bairro do Poço, após um trabalho de investigação da polícia.
A prisão do adolescente aconteceu em sua residência, no Vale do Reginaldo. No local, os policiais encontraram a roupa utilizada por ele no dia do crime: uma camisa vermelha, bermuda preta e boné branco. Mesmo confessando a participação no assalto, W.G.F. negou à polícia que tenha sido o autor do disparo que matou José Vasco. Sobre o objeto do roubo, a bicicleta, em depoimento à polícia, o adolescente explicou que foi abandonada na região do Poço, já que, segundo ele, não teria grande valor econômico.
Já o outro adolescente, M.S., de 17 anos, foi detido pela Polícia no início do mês de julho, durante uma operação no Vale do Reginaldo, local onde foi encontrado. Em depoimento à delegada Ana Luiza Nogueira, responsável pelas investigações, o menor confessou que atirou em Alfredo Vasco.
Mas o sentimento de alívio com as prisões se contrapunha com a sensação da impunidade. Por serem menores de idade, a família de Alfredo Vasco acredita que os dois infratores não continuarão detidos por muito tempo, o que demonstra a fragilidade das leis brasileiras, no tocante a esta questão.
“Não tenho como expressar o que é a dor de perder um pai principalmente da forma que perdi o meu. Isso já era algo indescritível. Mas posso garantir que no dia em que soube que o crime foi praticado por menor de idade, para todos foi um grande choque. Fiquei ainda pior do que quando soube que meu pai tinha morrido. Minha esperança era que pegasse o assassino do meu pai e de que a lei fosse cumprida. E tinha o desejo de que fosse um adulto o culpado, até mesmo tipo de crueldade, pois não há como imaginar que uma criança fosse capaz de cometer algo daquele tipo. Quando soube que era menor, veio a revolta de saber que seria mais um crime impune”, desabafou.
Mesmo com a condenação como autores materiais do homicídio, em 18 de julho, pelo juiz Fernando Tourinho de Omena Souza, da 1ª Vara da Infância e da Juventude, em Maceió, André Palmeira lamentou a pena para ambos, que cumprirão, nos próximos três anos, medidas socioeducativas na Unidade de Internação Masculina (UIM), em Maceió, voltando a discussão sobre a maioridade penal.
“Não temos uma política com força para mudar a lei. Falam em ser difícil mudar lei, mas fazer é sempre muito fácil. Um rapaz de 16 anos é capaz de entender o que é certo ou errado e não dá para entender o porquê dele não pagar perante a sociedade pelos seus atos. Além disso, todo mundo sabe que esses menores praticam crimes orientados por adultos, já que são instruídos a praticar o crime pela certeza de que rapidamente voltarão às ruas”, acrescentou Palmeira.
André Palmeira acredita ainda que a participação dos governos com ações voltadas para os jovens é de fundamental importância neste processo. Para ele, independente de pobre ou rico é preciso conscientizar crianças e adolescentes dos malefícios que a droga traz na vida de cada um. “O governo tem culpa de certa forma porque a violência parte da periferia, mas não porque é pobre. A classe alta também pratica crimes, mas na periferia a pobreza é uma realidade e lá eles não têm perspectiva de um futuro”, colocou, lembrando que é preciso que os gestores invistam em educação, escola em tempo integral, para que os jovens possam ter ocupação. “O que faz a violência é a ociosidade”.
No último mês de junho, a família do médico participou de uma homenagem simbólica que reuniu parentes e amigos de vítimas da violência em Alagoas. O projeto foi batizado como ‘Bosque em Defesa da Vida’, uma iniciativa que integra o 11° ato do Programa Ufal em Defesa da Vida.
Num espaço reservado no Campus da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), mais de cem mudas de árvores foram plantadas e cada uma recebeu o nome do parente assassinado, com a ideia de representar um espaço para a reflexão em relação às mortes registradas no estado.
“José Alfredo gostava de ler um bom livro, ouvir uma boa música e ser médico. Nos finais de semana, se reunir com a família e com os amigos. Gostava muito de festas, como o carnaval, e de fazer viagens. Meu pai era Médico, professor, marido, pai, avô, sogro, amigo... Uma pessoa maravilhosa que hoje se encontra ao lado do nosso mestre Jesus, nos orientando e nos protegendo”, diz a placa com o nome do médico.
Com lágrimas nos olhos, o filho da vítima encerra lembrando a dor de continuar a vida sem a presença da figura paterna. “Às vezes esquecemos que ele não está mais entre nós. Sentimos falta na hora do almoço, não mais ligamos o rádio naquele programa preferido dele; me pego pensando em ligar pra ele, mas como se não posso mais fazer isso? São coisas que não vão mudar. A morte repentina do meu pai mudou toda a rotina da família e nos desestabilizou. Não conseguiremos ser a mesma pessoa”, concluiu Palmeira, lembrando que por obra do destino a morte do pai fará sete meses em 26 de dezembro, dia em que seria comemorado seu aniversário de 68 anos.
Nestas últimas décadas, os homicídios se tornaram o calcanhar de Aquiles dos governos, que seguem numa luta incessante para combater esses índices alarmantes. De acordo com os dados do 'Mapa da Violência 2012 – Crianças e Adolescentes do Brasil", elaborado com base em números estatísticos oficiais pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, o país ostenta o prêmio de 4º lugar entre os 99 países do contexto mundial que não conseguem encontrar soluções que interrompam essa seta crescente.
Em 30 anos, as taxas de homicídios de crianças e adolescentes com idades entre zero e 19 anos cresceu de forma assustadora, chegando ao percentual de 346% em todo o Brasil. Ao todo, 176.044 menores foram assassinados no país, sendo que apenas em 2010 o número de mortes chegou a 8.686, o que significa 24 a cada dia do ano.
Para se ter noção do tamanho do problema, pelo menos 26% dessas mortes tiveram como causa fatores diretamente ligados à violência. Na última década os números e as taxas de homicídio de crianças e adolescentes, já elevadas, cresceram ainda mais, passando de 8.132 – taxa de 11,9 em 2000 – para 8.686 – taxa de 13,8 assassinatos para cada 100 mil crianças e adolescentes do país em 2010.
Mas se os números apavoram em escala referente aos 26 estados e o distrito federal, quando se trata de Alagoas a questão é ainda mais sangrenta e preocupante. Alagoas está entre um grande grupo de estados – 21 ao todo – cujas taxas de homicídios de crianças e adolescentes com idades entre 0 a 19 anos crescem ao longo da última década.
No mapa do Brasil, Alagoas fica com a 9ª posição em taxas de homicídios por 100 mil crianças e adolescentes. Em 2000, essa taxa no estado era de 10,1% chegando a 34,8%, em 2010, o que significa um crescimento de 245,4%. Quando se trata da região Nordeste, Alagoas ocupa a 4ª posição no número de homicídios passando dos 133, em 2000, para 426 em 2010, um índice crescente de 220,3%. O estado perde apenas para Bahia (1º lugar), Pernambuco (2º lugar) e Ceará (3º lugar). No entanto, apesar de ocupar a segunda colocação, Pernambuco apresentou uma redução de 20,4% no número de homicídios.
Nas capitais, os números de homicídios também apresentam um aumento, principalmente no Nordeste do país. Os dados mostram um comparativo entre os anos 2000 e 2010, e das nove unidades federativas apenas Recife e Teresina tiveram uma redução nos assassinatos, com -32,2% e -17,1%, respectivamente.
A capital das belas praias, de mar e areia clara, divide o título com ar sangrento que se respira. As capas de jornais com sangue e as ações dos menores infratores não escondem a dura realidade onde Maceió sai da 10ª posição para a 1ª nos dez últimos anos – 23,2% para 76, 8%. A realidade aterroriza numa comparação com Recife, Rio de Janeiro e São Paulo, grandes metrópoles que conseguiram reduzir os números de assassinatos nesta faixa etária.
Mas não cabe apenas a Maceió a mancha negra da violência. Juntamente com a capital, outras cinco cidades alagoanas aparecem numa lista contendo os 100 municípios com as maiores taxas de homicídios de crianças e adolescentes, considerando somente as unidades federativas com mais de 20 mil menores. Pelo censo de 2010, totalizavam 523 os municípios nessa situação e estão enquadradas as cidades de São Miguel dos Campos, Arapiraca, Rio Largo, Coruripe e União dos Palmares.
No Brasil, a maioridade penal é a partir de 18 anos idade, segundo o artigo 27 do Código Penal, reforçado pelo artigo 228 da Constituição Federal de 1988. O maior de 18 anos de idade que pratica crimes e contravenções penais pode ser preso, processado, condenado e, se for o caso, cumprir pena em presídios. Quando se trata de um menor de 18 anos de idade, de igual modo, ele também responde pelos crimes ou atos infracionais que pratica, conforme o artigo 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Diante do número alarmante de menores infratores envolvidos em crimes de grande repercussão, surge a discussão sobre a diminuição da maioridade penal e se existe essa possibilidade. Uma medida que é apoiada por grande parcela da população alagoana.
Para o estudante Bruno Nunes o problema é bem maior que diminuir a maioridade penal para colocar os menores na cadeia. “As cadeias são verdadeiras selvas. Porque esses jovens cometem tantos crimes ao invés de estarem estudando ou trabalhando. No modelo brasileiro, colocar adolescentes em cadeias junto com os mais altos presos do Brasil seria formar uma escola do crime, formar mais bandido, que sairiam querendo cometer mais crimes e não “ressocializados”, disse.
Ainda segundo o estudante, o tempo máximo para a punição dos menores deveria ser aumentado. “Acredito que o tempo máximo de medida de segurança aumentasse de três anos para oito e, que lá realmente eles pudessem se tornar “humanos” e voltassem para o convívio social. Falta escola, emprego qualidade de vida, por isso, os jovens caem no mundo do crime. Se investisse nisso, sairia até mais barato para o Estado do que construir presídios”, frisou.
Já para o engenheiro Ygor Rodrigues, a maioridade poderia ser reduzida para 16 anos. “Com essa idade o adolescente tem plena consciência de escolher um prefeito, governador e presidente. Ele deve ser julgado pelos seus atos da mesma forma que um de 18 anos”, afirmou.
Ele também acredita que não existe ressocialização. “Quando os menores e até mesmo os maiores são presos, deveria haver um trabalho de ressocialização, que seria fundamental que fosse feito com as famílias também. Não adianta você “salvar” um jovem se o meio que ele vive é propício e ele volta a cometer os mesmos erros”, pontuou.
Sobre o assunto, o advogado Welton Roberto explica que não se pode falar em mudança em maioridade penal sem uma alteração da Constituição Federal, já que a Carta Magna estabeleceu como critério básico que qualquer pessoa seja responsável pelo crime ter ao menos 18 anos completos.
“A Carta Magna dispõe sobre o assunto e por isso existe esse critério estabelecido em relação à idade. Apesar da sociedade pensar, de forma equivocada, que o menor infrator não é punido, isto não acontece. Falo em punição, como forma de castigo, porque no caso deles, não é uma pena. Eles podem responder pelo, se comprovada a participação e dependendo do tipo de crime, poderá ficar recluso até três anos, como uma medida sócio educativa”, afirmou.
O advogado lembra também que de acordo com a lei, a maior punição que um menor pode pegar é de três anos recluso. No entanto, quando se trata de um maior de idade, a pena pode variar dependendo do tipo do crime. “Por exemplo, se um adulto for julgado e condenado a 18 anos de prisão, deverá cumprir pelo menos um terço da pena e assim ganhar liberdade, mesmo que condicional, após três anos, já que existe a progressão da pena”.
Para que o menor infrator seja punido é preciso identificar as raízes dos problemas. Os menores infratores, em sua maioria esmagadora, são da camada pobre. “É um discurso fácil de se encantar, porque a sociedade acredita que punir é resolver o problema, e não é bem assim. Precisamos entender que esses menores irão sair dos centros de reclusão e, no Brasil, mais precisamente em Alagoas, não são aplicadas adequadas medidas sócio educativas. Porque eles saem pior que entram”, afirmou.
O advogado disse ainda que poderia ser a favor da maioridade penal se o modelo aplicado pelo Estado funcionasse. “Como podemos falar em punições quando você tem crianças fora da sala de aulas, escolas que nem sequer começaram o ano letivo? Onde não tem saneamento, saúde. O sistema é falho. Se diminuísse para 12 anos, teríamos mais jovens de dez ou oito anos cometendo crime.”, afirmou.
Uma das soluções, segundo Welton Roberto, seria uma união eficaz entre Município e Estado. “Há uma ausência do Estado nas comunidades carentes. Os menores cometem crime porque não existe um contexto de educação. Teria que se investir no primeiro emprego, no jovem aprendiz. Temos que entender ainda que o crime existe e, vou usar o exemplo do traficante, porque de certa forma ele ajuda a comunidade ao qual ele está inserido. Se houvesse uma atuação do governo, em fiscalizar o bolsa família e os outros programas, essa realidade poderia ser outra”, frisou o advogado.
Altos índices de analfabetismo, pior pontuação no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), problemas de atendimento na saúde, números alarmantes de desempregados, falta de moradia. Essas são algumas dos problemas que podem estar relacionados à violência e definir o porquê Alagoas continua estampando negativamente as capas de jornais no Brasil.
Se para todo problema há uma solução, neste caso a questão é macro. Mesmo com os investimentos milionários em planos de segurança, com policiais nas ruas, helicópteros sobrevoando diariamente as cidades ou a contratação de novos servidores para atuar na malha protetora da sociedade.
Para o sociólogo Jorge Vieira, as raízes para o problema são antigas. “Desde a crise mundial que o Brasil enfrenta os índices alarmantes de violência. O jovem não tem perspectiva de mudança, não tem escola, saúde. O Brasil é carente de políticas públicas e isso interfere diretamente na formação do jovem”, disse.
Ainda segundo o especialista, a escola de tempo integral seria uma das alternativas para minimizar o problema. “Com os jovens na escola o dia todo, com esporte e aulas dinâmicas, os índices de criminalidade cairiam consideravelmente, porque mente vazia é oficina para o diabo. Com essa atitude corta o mal pela raiz”.
A desestruturação da família é o fator essencial e decisivo na formação do jovem. “As vezes as pessoas pensam que o pai e a mãe morando junto evita que o jovem experimentem o crime, o que não é verdade. Muitas vezes nesses lares o psicológico é frágil, abrindo um leque de possibilidades para que o jovem cai no crime, no alcoolismo, nas drogas”, frisou.
Sobre as penas aplicadas para os jovens Jorge Vieira alerta que muitos crimes são encomendados por pessoas maiores de 18 para se livrar da pena. “O sistema é incompetente e os lugares onde os jovens ficam em reclusão, que poderia ser um espaço de ressocialização, na verdade é uma escola para o crime. Como a pena para os menores de 18 que cometem crime é pequena, os maiores utilizam essa estratégia para não serem punidos” afirmou.
Quando se trata da psicologia, segundo Sigmund Freud, a identidade do ser humano forma-se até os cinco anos de idade. Se a criança passa por algum transtorno, como um estupro, ela pode desenvolver uma mentalidade perversa e cometer crimes. De acordo com a psicóloga Silvana Barros, é um erro dizer que os crimes cometidos por menores são, em sua maioria, da camada pobre.
“Esses crimes vão muito da estrutura familiar que eles estão inseridos. Encontramos famílias desestruturadas sim na camada pobre, por falta políticas públicas, falta de saúde, educação. E muitas vezes, os meninos de rua vêm dessa realidade, fogem de casa para não ver as brigas dos pais, ou por abusos”, afirmou.
Sobre a discussão da maioridade penal a psicóloga alerta que a Academia Brasileira de Pediatria diz que a adolescência começa aos 12 anos e vai até os 19, ou seja, a partir de 12 anos o jovem já seria responsável pelos seus atos.
“Acredito que a discussão não seja maior idade penal. Seria a forma de ressocialização, que não acontece, de inserir o jovem na sociedade. A droga invade cada vez os lares e não há clínicas o suficiente, como também o governo não incentiva. Quando acontece um crime como esses, de forma brutal, com certeza tem esses fatores envolvidos: a desestruturação familiar e a as drogas”, afirmou.
** As fotos utilizadas na reportagem são ilustrações retiradas na Internet, cedidas pela família da vítima ou fazem parte do arquivo do CadaMinuto